O Ventoso e o Bento

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O Bento, o sobrinho e afilhado do Juliano, este que escreve para vocês neste blog, digo pra vocês, fez a sua grande descoberta por esses dias. Isso mesmo, talvez possa-se dizer que o Bento fez, há poucos dias, a sua primeira grande descoberta desde seu primeiro instante de vida, no hospital Ernesto Dorneles, em Porto Alegre. Porque outras pequenas descobertas o Bento já tinha feito. Por exemplo. Ele descobriu, desde que nasceu, que chorar não é a forma mais eficiente de receber o que lhe falta – ou leite ou alguém que lhe faça dormir. Descobriu que chorar não é a forma mais eficaz. É a única. Outra pequena, mas fundamental, descoberta do Bento, o afilhado do Juliano e da Samanta, foi sua pequenina, mas ágil, língua. E imediatamente junto desta, Bento aprendeu outra coisa de igual importância. Sabem o que é? É que embora a língua o ajude a mamar, fazendo repousar sobre si o bico do seio materno e auxiliando na obtenção do leite (eu imagino que seja assim), esta mesma língua, esta mesma e insubstituível língua, não pode agarrar objetos distantes mais de cinco centímetros da boca. Ela é simplesmente incapaz disso.

Mas estas são apenas as pequenas descobertas do Bento, neto do José e da Ema. A maior de todas ainda não contei. E quem sou eu? Eu faço parte desta magnífica descoberta. Aguardem.

Os brasileiros tiveram a presença de espírito de metaforizar a genial teoria da evolução de Darwin com o famoso “quando a água bate na bunda o sujeito aprende a nadar”. Bom, se fica mais fácil de entender, sem problemas, usemos esta metáfora mesmo. Digamos, então, que, quando o Bento descobriu que sua hábil língua era inofensiva a objetos distantes, a água bateu na sua fofa e branca bundinha. Certo? E Bento, o neto da Dona Elisa, teve de aprender a nadar. Certo? E como Bento fez isso? Batendo as perninhas! Não! Nada disso. A fantástica descoberta do nosso Bento são, atenção: as suas pequeninas mãos. Isso mesmo. Há algumas semanas que o Bento já não repete suas frustadas tentativas de agarrar as coisas com a língua, ele usa suas duas próprias mãos.

Ventoso

Ventoso

E eu, quem sou? Prazer, meu nome é Ventoso. Aham, Ventoso. Sou nada mais, nada menos do que o primeiro brinquedo no qual o Bento tocou conscientemente (conscientemente, isso é importante) com suas duas desajeitadas mãos. Claro que virão outros, como a Centopéia, dizer que foi nela que o Bento tocou primeiro. Nãããão foi. Não acreditem nessa impostora. Foi em mim, em quem vos escreve agora, no Ventosinho aqui, que o Bento inaugurou seu tato. Bom, fui dado de presente ao Bento justamente pela Samanta e pelo Juliano, seus dindos, e meu nome é este porque eu tenho uma enorme ventosa na minha base, o que me permite ficar grudado em quase qualquer superfície da casa. Essa é, portanto, minha primeira virtude: adapto-me facilmente. Depois disso, colocam a criança, neste caso, o Bento,  na minha frente e ele fica girando três astes de plástico presas bem no meio do meu corpinho. As grandes atrações são os simpáticos animaizinhos coloridos que ficam na ponta de cada uma das minhas astes: o tucano, a borboleta e o macaco. As três astes giram como num catavento e os três bichinhos coloridos também contornam o seu próprio eixo. Manero, né? As crianças dessa idade, da idade do Bento, adoram.

Bem, devidamente apresentados, eram estas as novidades que eu tinha pra contar pra vocês. Que eu, o Ventoso, sou o mais novo amigo do Bento, e que o Bento, o filho da Ana e dos Luís, acaba de descobrir que, além de chorar, de mamar, de dormir e de adestrar sua língua, agora pode usar suas duas e poderosas mãos.

Juliano RigattiO Ventoso e o Bento
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Eu enganei o CLJ

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Em qualquer esporte, a tese mais conhecida de todos os técnicos e da diretoria é a que o time precisa saber, quando perde, porque perdeu, e saber, quando vence, porque venceu. Esta última, contudo, é a mais importante para que a tão desejada vitória se repita.

E vocês sabem que no CLJ (e no EJC, e no Cenáculo, e no Onda, e no ECC) essa máxima também vale?

Confesso pra vocês que assim como fui enganado pelo CLJ, eu, muitas vezes – e até sem saber –, tentei dar troco. Tentei enganar o CLJ. E presenciei muitos fazerem o mesmo.

Explico.

Os grupos de jovens – especialmente o de jovens – atraem pessoas com problemas familiares, com dificuldade de aceitação na roda de amigos e na sociedade, com necessidade de reconhecer a si mesmo. O CLJ cumpre num primeiro momento, portanto, uma nobre função social: a de elevar a auto-estima da gurizada, fazendo-os enxergar valor naquilo que são, naquilo que fazem, naquilo que acreditam. Isso tudo – é importante que se deixe claro – sem exigir em troca qualquer bem ou quantia em dinheiro. É fundamental que se registre essa diferença elementar entre esta proposta da Igreja Católica e muitas outras que nos são ofertadas por aí, e que estão presentes até nos centros das grandes metrópoles. Antes mesmo de catequizá-los, de convertê-los, o CLJ é uma instituição sem fins lucrativos, voltada à inclusão. E eu não precisaria repetir aqui que constatações como essa só aumentam minha admiração e minha paixão por este Movimento.

Mas e quando enganamos o CLJ?

Quando, pecadores que somos, nos aproveitamos dessa nova fase de auto-estima em alta e alimentamos nosso próprio orgulho, buscando interesses individuais, lançado mão de ferramentas como o egoísmo, a fofoca, o julgamento e a autopromoção. Ou você nunca foi testemunha de jovens que cantavam mais para mostrar a voz do que para louvar? Ou você nunca conviveu com coordenadores de equipes que mais pareciam políticos angariando votos e menos lideres pela causa de Cristo? Ou você nunca conheceu ninguém que confundia aumento de responsabilidade com aumento de glamour?

Amigos em Cristo, isso é enganar o CLJ!

Felizmente, as bases fortes do Movimento impediam, no meu tempo, essas práticas de prosperar. Imagino que ainda hoje as impeçam. Nunca mais esqueci o que o Pe. Flavio Canisio Steffen, então diretor espiritual de um curso aqui em Canoas, me disse, acho que em confissão: “Juliano, Deus não condena o pecador, mas é implacável com o pecado.” E por condenarmos o pecado, sem nunca perder a esperança no pecador, é que ajudamos este Movimento a prosperar. Porque o mesmo jovem que um dia canta para que o elogiem, um dia cantará por Deus e encherá os olhos de alguém de lágrimas. O mesmo que luta por causa própria um dia canalizará todo seu talento de comunicador para fazer daquele retiro o melhor retiro de todos. E o mesmo que deseja ser admirado como coordenador, um dia voltará para casa agradecendo a Deus por ter contribuído para a conversão de muitos apenas limpando o chão e os banheiros da casa onde o curso foi realizado.

Como no futebol, como no vôlei, também no CLJ é importante que saibamos porquê vencemos. Digo com a convicção de quem já venceu e de quem já viu muitos vencerem em Cristo: o segredo está no que entendemos por doação, por caridade. O segredo da vitória em um momento de espiritualidade, em uma palestra ou em um curso de três dias está em fazer com amor, não esperando absolutamente nada em troca. Se precisamos saber porquê vencemos, voltemos nosso olhar para a Eucaristia e sigamos o seu inesquecível exemplo de doação. Cristo entregou, sacrificou e consagrou seu corpo e sangue em nosso favor. Não desejou a fama, não desejou o reconhecimento, não desejou uma coroa mais brilhosa e dourada. Buscava naquele gesto simplesmente a nossa felicidade. E só por isso, costumo dizer, dividiu a nossa historia – e até a dos ateus – em A.C. (antes de Cristo) e D.C. (depois de Cristo).

A tentativa de enganar o CLJ é a explicação para a derrota, se querem saber. Somos todos apóstolos, operários da grande messe. E o Espírito Santo é que nos capacita para que façamos o melhor de nós e nos prepara para que esperemos em troca do esforço a melhor das recompensas: a conversão do próximo.

Eu enganei o CLJ

Em qualquer esporte, a tese mais conhecida de todos os técnicos e da diretoria é a que o time precisa saber, quando perde, porque perdeu, e saber, quando vence, porque venceu. Esta última, contudo, é a mais importante para que a tão desejada vitória se repita.

E vocês sabem que no CLJ (e no EJC, e no Cenáculo, e no Onda, e no ECC) essa máxima também vale?

Confesso pra vocês que assim como fui enganado pelo CLJ, eu, muitas vezes – e até sem saber –, tentei dar troco. Tentei enganar o CLJ. E presenciei muitos fazerem o mesmo.

Explico.

Os grupos de jovens – especialmente o de jovens – atraem pessoas com problemas familiares, com dificuldade de aceitação na roda de amigos e na sociedade, com necessidade de reconhecer a si mesmo. O CLJ cumpre num primeiro momento, portanto, uma nobre função social: a de elevar a auto-estima da gurizada, fazendo-os enxergar valor naquilo que são, naquilo que fazem, naquilo que acreditam. Isso tudo – é importante que se deixe claro – sem exigir em troca qualquer bem ou quantia em dinheiro. É fundamental que se registre essa diferença elementar entre esta proposta da Igreja Católica e muitas outras que nos são ofertadas por aí, e que estão presentes até nos centros das grandes metrópoles. Antes mesmo de catequizá-los, de convertê-los, o CLJ é uma instituição sem fins lucrativos, voltada à inclusão. E eu não precisaria repetir aqui que constatações como essa só aumentam minha admiração e minha paixão por este Movimento.

Mas e quando enganamos o CLJ?

Quando, pecadores que somos, nos aproveitamos dessa nova fase de auto-estima em alta e alimentamos nosso próprio orgulho, buscando interesses individuais, lançado mão de ferramentas como o egoísmo, a fofoca, o julgamento e a autopromoção. Ou você nunca foi testemunha de jovens que cantavam mais para mostrar a voz do que para louvar? Ou você nunca conviveu com coordenadores de equipes que mais pareciam políticos angariando votos e menos lideres pela causa de Cristo? Ou você nunca conheceu ninguém que confundia aumento de responsabilidade com aumento de glamour?

Amigos em Cristo, isso é enganar o CLJ!

Felizmente, as bases fortes do Movimento impediam, no meu tempo, essas práticas de prosperar. Imagino que ainda hoje as impeçam. Nunca mais esqueci o que o Pe. Flavio Canisio Steffen, então diretor espiritual de um curso aqui em Canoas, me disse, acho que em confissão: “Juliano, Deus não condena o pecador, mas é implacável com o pecado.” E por condenarmos o pecado, sem nunca perder a esperança no pecador, é que ajudamos este Movimento a prosperar. Porque o mesmo jovem que um dia canta para que o elogiem, um dia cantará por Deus e encherá os olhos de alguém de lágrimas. O mesmo que luta por causa própria um dia canalizará todo seu talento de comunicador para fazer daquele retiro o melhor retiro de todos. E o mesmo que deseja ser admirado como coordenador, um dia voltará para casa agradecendo a Deus por ter contribuído para a conversão de muitos apenas limpando o chão e os banheiros da casa onde o curso foi realizado.

Como no futebol, como no vôlei, também no CLJ é importante que saibamos porquê vencemos. Digo com a convicção de quem já venceu e de quem já viu muitos vencerem em Cristo: o segredo está no que entendemos por doação, por caridade. O segredo da vitória em um momento de espiritualidade, em uma palestra ou em um curso de três dias está em fazer com amor, não esperando absolutamente nada em troca. Se precisamos saber porquê vencemos, voltemos nosso olhar para a Eucaristia e sigamos o seu inesquecível exemplo de doação. Cristo entregou, sacrificou e consagrou seu corpo e sangue em nosso favor. Não desejou a fama, não desejou o reconhecimento, não desejou uma coroa mais brilhosa e dourada. Buscava naquele gesto simplesmente a nossa felicidade. E só por isso, costumo dizer, dividiu a nossa historia – e até a dos ateus – em A.C. (antes de Cristo) e D.C. (depois de Cristo).

A tentativa de enganar o CLJ é a explicação para a derrota, se querem saber. Somos todos apóstolos, operários da grande messe. E o Espírito Santo é que nos capacita para que façamos o melhor de nós e nos prepara para que esperemos em troca do esforço a melhor das recompensas: a conversão do próximo.

Juliano RigattiEu enganei o CLJ
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Os refens estao vivos!

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Acordei tarde esta manha e a esperança parecia ter ressurgido. E nao eh que encontrei um contato dos sequestradores na minha caixa de correio eletronico? Fui correndo ver do que se tratava, ansioso por um sinal de vida. Os acentos do meu blog tinham de estar vivos, repetia pra mim mesmo. Tinham de estar. E a noticia do dia: cerca de 60 horas depois, eles estao vivos!

A promessa eh que em breve eles estarao de volta.

***

Uzina wrote:

> I did:
> I write my text with accents, as I always did.
>
> I saw:
> The post puts symbols of question marks in place of (“?”)
> All characters with accents.
>
> I expected:
> I wish this could be adjusted as quickly as possible.

That was happening because the character set had been removed from the Settings > Reading page. I have fixed that option for you and those characters should not appear now. You will probably need to manually fix some of the characters in the latest post though.

Juliano RigattiOs refens estao vivos!
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Sequestro

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Atencao: o motivo para o recesso deste blog jah foi falta de tempo e falta de inspiracao. Mas agora, tendo alguns textos para compartilhar com voces, a razao eh um crime do qual a Uzina foi vitima: sequestraram meus acentos. Nao ha nada que os faca devolver. Qualquer texto que eu coloque aqui, acaba vitima desses criminosos: roubam-lhe os acentos. Querem ver um exemplo? Esta frase contém vários acentos que já foram sequestrados.

Jah ofereci um alto valor como resgate. Ainda nao obtive retorno.

PS.: Suspeita-se que a quadrilha seja a mesma que pos fim ao trema e a alguns outros acentos pelo quais choramos de saudades ateh hoje. Outra pista nos leva a hackers adolescentes, que nao entendem a necessidade dos tais sinais graficos. A tecnica adotada por eles em MSNs e afins eh a mesma que eu utilizo neste momento para tornar este post compreensivel. Mas nada disso se pode provar. Apenas suspeitas.

Juliano RigattiSequestro
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Vá ao dentista regularmente

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Sempre achei que salas de espera de dentista tinham de ter coisas mais interessantes que revistas velhas de fofoca.

A porta foi aberta de supetão.

– Ai, tô atrasada. Também, tá uma confusão lá em Novo Hamburgo.. tão instalando o trem, sabe? – ela entrou sala adentro, desculpando-se, esbaforida. Cabelos oleosos, rosto e sombrinha judiados, trajes simples. O aparelho nos dentes era o único indicio de que ela cuidava de si. Mais tarde vi que a pista era falsa.

– Que horas são?

Estávamos a sós. Fiz que não tinha relógio.

– Umas quatro e cinco, quatro e dez – respondi.

– E que horas é a tua?

– Agora, às quatro.

Ela sentou-se.

– Então a minha é às quatro e meia. Ainda bem. Vai pôr aparelho?

– Não, só revisão. Já tirei.

– Eu é mais três anos com este. Fui assaltada, sabe? Me deram uma coronhada na boca, afrouxou tudo aqui na frente. Tive que fazer tratamento de canal e colocar aparelho. Mais três anos…

– É, é brabo. Quer dizer que estão reformando o trem lá em Novo Hamburgo, é? – o jornalista aqui já queria informação.

– Sim, tão levando o trem de São Leopoldo pra lá. Tá indo ligeiro a obra, sabe? Eu queperdi meu sítio..

– Perdeu, é? Tu tinha um sítio em Novo Hamburgo?

– Sim, e criava égua, cavalo, porco e galinha. Daí tive quevender pro trem passar lá. Agora, tô morando num apartamento pequeno, sabe? Financiado pela Caixa. Esse mês a luz deu 12 reais só, acredita? É pra baixa renda. E isso que eu tenho geladeira, televisão, carrego celular, tenho freezer.

– Barato mesmo, 12 reais de luz é barato mesmo.

– É, mas eu sinto falta do meu sitiozinho. Eu sabia até caçar! Caçava ratão do banhado. Com um tipo de ratoeira. E é tri bom! Mais limpo que galinha, sabia? Eles não comem porcaria, só comem.. só comem.. ai, sabe? Comem coisa limpa.

Concordei, claro. Mas acho que deu pra disfarçar minha falta de intimidade, digamos assim, com o assunto.

– Eu não gosto de rato também. Tinha nojo daqueles ratões pretos, gordos. Mas depois que tu tira a pele, aparece a carne bem branquinha. Tri bom.

Não sou tão fácil de ser convencido, moça.

– O pessoal de lá adora. Tem pra vender por tudo lá em Novo Hamburgo. Eu caçava eles pequenos, botava numa gaiola, daí engordava e depois comia. Tri bom. Tê te dizendo.

Mas eu não estava duvidando. Por Deus que não.

Meu dentista interrompeu minha imersão na culinária urbana. Cumprimentou-me e convidou-me para entrar. Quase ignorou a presença da moça. Só entendi o descrédito depois.

– Que histórias tem essa tua paciente – comentei, porta já fechada.

– Ainda não descobri o nível de loucura ou de sanidade dela.

Lamentei que aquilo tudo não fosse verdade.

– A mãe dela, uma senhora distinta aqui de Porto Alegre, que paga a consulta. Acho que é doida essa moça. Ela me conta que faz ponto no Mercado Publico e como não aguenta sem sexo todo dia, vai visitar o marido na cadeia pra transar com ele.

Àquela altura, eu já o ouvia de boca aberta. Bem que podia ser por causa de todo aquele enredo, mas era só em obediência ao pedido do doutor. Ele examinava minha dentição e minha mordida.

– Outro dia, disse que não entendia a polícia. Prenderam-na porque roubou, mas quando matou o primeiro marido não fizeram nada.

Eu gemi pra dizer-lhe que eu o ouvia.

– Quer saber mais?

Resmunguei de novo.

– Uma paciente tava deitada aí onde tu estas. Foi esses dias. De repente, baixou as calças até esta altura aqui.

Tocou no meu joelho.

– Olha como tô magra, doutor, ela insinuou. Eu olhei pros olhos e perguntei onde estava o marido dela.

Acho que arregalei os olhos para o meu dentista católico. Era um misto de surpresa e de admiração pelo seu bom senso. Ele sorriu, orgulhoso de suas histórias.

Eu fui embora. Com a certeza de que inspiração é uma desculpa de quem não vai a dentistas. Escritores que cuidam de seus dentes não precisam de tanta imaginação assim.

Juliano RigattiVá ao dentista regularmente
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Jornalistas são moscas enxeridas

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Imagina quantas vezes nessa vida tu pretendeste ser uma mosquinha para poder ver alguma cena privada ou escutar alguma conversa alheia?

Imagina quantas vezes.

Há uns meses, participei do 12º Congresso Brasileiro de Comunicação Corporativa, em São Paulo, promovido pela Mega Brasil. Faz tempo que queria contar isso aqui. O evento se diz o maior da América Latina a discutir o tema. Das grandes palestras e painéis simultâneos participaram cerca de 700 profissionais de muitos Estados brasileiros. Cada um com sua necessidade e curiosidade específica e todos com uma angústia parecida inquietando a já inconstante rotina de comunicador: como decifrar o novo mundo das redes sociais a ponto de estar apto para lidar com ela?

“Saio traumatizado desse evento”, confessou João José Forni, experiente jornalista gaúcho e especialista em gestão de crises de reputação empresarial. “Depois do primeiro painel sobre mídia social, eu sai correndo para me cadastrar no Twitter”, completou, arrancando risadas da empática platéia que o ouvia na palestra que encerrou o evento.

Claro que também discutimos sustentabilidade, relacionamento com a Imprensa, mensuração de resultados. Mas nada foi tão repetido e despertou tanto a nossa atenção como tema das redes sociais. Este fenômeno não tão recente, conhecido pelos seus aplicativos Orkut, Twitter, WordPress, Myspace, Facebook, dá ao consumidor de informação um poder de influência no mundo real nunca antes visto. Rupert Murdoch, o megaempresário da mídia, com mais de 800 empresas administradas em cerca de 50 países, diz que algo parecido só aconteceu com a informação há cerca de 500 anos, quando o primeiro jornal foi impresso. Naquele tempo, o cidadão misturado às multidões teria tomado o controle e ditado o rumo do jornalismo de massas, o qual conhecemos hoje. Ou conhecíamos ontem.

O que tá pegando é que nem mesmo os especialistas em mídia conseguem precisar o impacto que o YouTube e o Facebook vão causar nas nossas vidas. E nas dos brasileiros, especialmente. Isso porque já há mais brasileiros se informando na internet do que em frente à televisão, sabiam? E que o Google transferiu a administração do Orkut dos Estados Unidos para o interior de Minas Gerais por conta da liderança que exercemos neste site de relacionamentos, sabiam? E que em tempo de permanência no Twitter o Brasil já foi para o topo também, vocês sabiam? E mais: do tempo que um brasileiro passa na web, 34,5% é dedicado à rede social. Sabiam? Há muito mais coisa que ainda não sabemos. E a velocidade com que seremos surpreendidos me assusta.

Quantas vezes mesmo você já pretendeu ser a tal mosquinha para bisbilhotar as coisas do outro?

Pois então seja a tal mosca.

Porque a mídia social tratou de bater um raio x das relações interpessoais, que antes aconteciam na privacidade da comunidade real, de modo que podemos, como um inseto, partilhar e assistir em vídeo, texto ou áudio as confissões de alguém ou de um grupo. “Há uma mudança filosófica em curso: confesso, logo existo”, analisou um dos palestrantes do encontro.

Concordo com quem está pensando que tudo isso não é tão novo assim. Concordo. O que é novo é o tamanho dessa confusão. Em 1997, Alex Primo (reconhecido pesquisador de comunicação e informação na UFRGS) citou Jean Baudrillard e sua obra “Tela total: Mito-ironias da era do virtual e da imagem”, e reproduziu um pensamento seu que dizia “hoje, não pensamos o virtual; somos pensados pelo virtual. Essa transparência inapreensível, que nos separa definitivamente do real, nos é tão ininteligível quanto pode ser para a mosca o vidro contra o qual se bate sem compreender o que a separa do mundo exterior. Ela não pode nem sequer imaginar o que põe fim ao seu espaço”. A publicação de Primo, intitulada “A emergência das comunidades virtuais”, tem, portanto, 12 anos. Época em que o havia de mais revolucionário era o chat.

Aprendemos a escrever um lead. Sabemos que a criação de bons jornais populares no Brasil é significado de prosperidade. Já somos premiados e reconhecidos no exterior pela qualidade e profundidade de nossas reportagens. Exibimos telejornais de alta qualidade – técnica, no mínino. Mas há mais de uma década nós, jornalistas, como moscas enxeridas, batemos cabeça ao procurar entender as mídias sociais e nos aproveitar delas.

Os jornalistas não sabem o que fazer com o Twitter, não sabem se relacionar com o Orkut. Os assessores de Imprensa, menos. Os departamentos de relacionamento com o cliente, tampouco. Bibliografias, teses, dissertações, seminários, workshops e encontros como o que participei, já arriscam fórmulas do tipo “passo-a-passo”. Listam benefícios que a rede social nos traz, assim como riscos e perigos iminentes. Já é um avanço.

Com menos ou com mais pressa, quem é jornalista precisará saber lidar com este novo meio.

Porque ainda não sabe.

Ou sabe?

Juliano RigattiJornalistas são moscas enxeridas
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