Viver o Natal é sonhar com Deus

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Para quem ainda procura uma reflexão que fortifique o Natal dentro de si, eu recomendo esta. Para Dom Dadeus, celebrar o Natal com fé é sonhar com Deus. Foi o melhor que li sobre o Natal este ano.

A VERDADEIRA LUZ
Por Dom Dadeus Grings

A oração desta noite nos orienta pela claridade da versadeira Luz. Para enxergarmos necessitamos de três condições: um objeto visível, uma luz que o ilumine e uma visão que permita ver. Pode-se discutir sobre a relação estas três condições ou sobre a preponderância de uma sobre a outra. O fato é que não se enxerga se não existir um objeto, nem se vê se não existir luz para iluminar e não se enxerga se não se tem capacidade de enxergar. Não é necessário explicar o que seja enxergar para usufruir da visão, nem é necessário ter consciência se qual a influência subjetiva que traz para a vida humana uma realidade que lhe é exterior.

O Natal transporta a visão natural para o campo da fé. Fala, por isso, de uma “verdadeira luz”, não plasmada por corpúsculos e ondas que sofrem a retração do objeto iluminado. Envolve um mistério que, na terra, é apenas vislumbrado, sendo plenamente usufruído somente no céu. De que luz se trata aqui? Falamos de uma iluminação divina. Abre para uma realidade que “nenhum olho viu, nenhum ouvido ouviu, nenhum coração humano jamais consegue imaginar”.

Falamos de plenitude. Na verdade ela só acontece no céu. Mas, no Natal, já nos situamos na perspectiva desta plenitude. Chegamos ao momento mais marcante de nossa História: Deus se fez homem e veio, em pessoa, plenificar toda a caminhada humana. É o momento de antegozar, pela fé, o que veremos na realização definitiva. Sonhamos com Deus.

Juliano RigattiViver o Natal é sonhar com Deus
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O que separou a família brasileira, por Fabrício Carpinejar

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Amigos, não pude deixar de compartilhar com vocês esse artigo do jornalista e poeta Fabrício Carpinejar. Ele foi publicado hoje (6/11/2012) no jornal Zero Hora (RS). Estou reproduzindo-o com autorização do próprio autor.

Tenho certeza que este poema falará um pouco da família de vocês. Do presente de vocês. Do futuro de vocês. Em mim, não causou tristeza, mas indignação. Estamos deixando de viver nossa família graças à preocupação em vivê-la mais.

Beijo grande,
Juliano Rigatti

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O que separou a família brasileira

Eu sei o que desuniu a família brasileira.O momento em que ela abandonou o tradicional almoço em casa e procurou a rapidez do restaurante a quilo.Quando ela se desinteressou por completo da residência. Quando trocou a diarista pela faxineira duas vezes por semana.

Quando começou a comprar comida congelada e economizar com os talheres. Quando abdicou do pãozinho da padaria do final da tarde.

Quando as saídas ao supermercado tornaram-se frequentes. Quando o intervalo do trabalho diminuiu consideravelmente.

Quando a vassoura sumiu de trás da porta. Quando o avental desapareceu do seu gancho.

Quando ter uma horta passou a ser irrelevante. Quando o pai não mais visitou sua oficina de marcenaria na garagem.

Quando a tabuleta de bem-vindo acabou dispensada. Quando o capacho se divorciou da porta.

Quando a mãe adiou o jardim. Quando a vista de fora superou o carinho da decoração.

Eu sei eu sei eu sei o instante exato da transformação. Foi na hora em que a gente parou de vestir o botijão de gás.

Aquele ato mudou a mentalidade da classe média.

Cuidar do botijão significava zelar pelos detalhes, pela aparência e ordem doméstica. Mostrava uma preocupação com o olhar das visitas. Um carinho com os coadjuvantes da rotina. Um capricho com as gavetas e despensas e forros e fundos e cantos e quinas.

Não se podia deixar o gás daquele jeito sujo e engraxado no coração de azulejos da cozinha.  Correspondia a um ultraje, a falta de educação, a ausência de asseio.

Ele precisava estar agasalhado. Todos os objetos do mundo mereciam uma capa: os cadernos de aula, o filtro de barro, o liquidificador, os ternos no armário, os carros na garagem.

Os objetos tinham que durar: geladeira era para a vida inteira, o fogão era para a vida inteira, máquina de lavar era para a vida inteira. Não se pensava em trocar, não se guardava o certificado de garantia, absolutamente dispensável.

Minha mãe não largava os pedais da Singer nos finais da tarde, elaborava tampas coloridas para as compotas de doces ou revestimentos para penduricalhos.

É óbvio que costurava, mensalmente, uma saia de renda para o gás, aproveitando sobras dos tecidos da cortina.

Eu achava que o botijão fosse uma irmã.

Meu irmão caçula já considerava um menino e chamava sua roupa de poncho.

– Mas é floreado! – eu dizia. – Não existe poncho floreado.

Vestir o botijão revelava o quanto nos importávamos com o desnecessário.

O quanto tínhamos tempo livre para amar.

Tempo livre para amar a família.

Tempo livre.

Juliano RigattiO que separou a família brasileira, por Fabrício Carpinejar
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Travessia para o Ano-Novo

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Por Nilson Souza, articulista do Segundo Caderno do jornal Zero Hora
Publicado em 20/12/2008

Dois-mil-e-nove já nos espreita na esquina enfumaçada do tempo. Aguarda, pacientemente, a sua hora de entrar em cena. Ninguém sabe que cara terá, se será bonito ou feio, se será suave ou truculento, se entrará no palco atirando beijos ou lançando impropérios e sapatos. A única coisa certa é que virá, inexoravelmente, e será o protagonista de nossas vidas por 365 dias. Então, só nos resta uma atitude: fazer dele aquilo que quisermos que ele seja. Para começar, não devemos esperá-lo. Nós é que devemos ir até ele. Tomemos, pois, a iniciativa.

Em vez de ficarmos contando os dias que faltam para a virada do calendário, que tal preenchê-los com esperança? Ainda dá tempo. Amanhã é domingo e todos os domingos são tingidos de exuberância, como esses flamboaiãs floridos que enfeitam as calçadas de Porto Alegre. É um dia abençoado, que sempre nos reserva alguma surpresa agradável. Digo-o por experiência recente: no domingo passado, resolvi dar um passeio de carro com duas crianças da família e tomei uma estradinha de terra lá pelas bandas de Gravataí. Andávamos devagar, num lugar pouco habitado, com árvores dos dois lados. De repente, uma borboleta fluorescente, de um azul intenso, passou a nos acompanhar, como se nos escoltasse pelo caminho desconhecido. Nunca tinha visto uma borboleta daquela cor, com aquele brilho e com aquela disposição de encantar olhares infantis. Foi ela que me vez pensar nesta travessia para o ano que nos espera.

Aproveite, portanto, este domingo que ninguém ainda usou e que pode ser todo seu. Durma até mais tarde, cante no chuveiro, dê flores para quem você ama, abrace um amigo e deseje bom dia para o passante anônimo. Talvez ele retribua com o seu melhor sorriso.

Próxima parada: Natal. Será na quinta-feira, mas já podemos vislumbrar desde agora a noite encantada com suas luzes coloridas, músicas de harpa e fogos de artifício competindo no céu estrelado. Logo estaremos neste cenário de sonhos. Ninguém precisa se apressar, nem dar corda demasiada na bússola das horas. Basta seguir a estrela da manhã. Ou a borboleta.

Então, a travessia ficará restrita à derradeira semana do ano velho. Uma semana inteirinha para ser aproveitada de maneira intensa, para ser vivida prazerosamente, para ser compartilhada com as pessoas que habitam os nossos corações. Parece pouco? É o tempo de vida de uma borboleta fluorescente.

Juliano RigattiTravessia para o Ano-Novo
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Pais, leiam isso!

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Maravilhosamente
Por Fabrício Carpinejar

Vicente gosta de jogar futebol. Vicente gosta de jogar cartas de Supertrunfo. Vicente gosta de cavar a terra com pá e galochas. Vicente gosta de colecionar figurinhas. Vicente gosta de desenhar deitado no tapete. Vicente gosta de ajudar a mãe na cozinha. Vicente gosta de ir ao cinema e comer pipoca para acumular pontos. Vicente gosta de escolher sua roupa e colocar a camisa nova por cima de uma velha. Vicente gosta de jogar farelos para as pombas antes de chegar à escola. Vicente gosta de cortar os cabelos de seus bonecos. Vicente gosta de receber camisetas de times. Vicente gosta de tornear esculturas de argila. Vicente gosta de jogar videogame. Viente gosta de classificar restaurantes. Vicente gosta de dormir no carro. Vicente gosta de tirar fotografias. Vicente gosta de limpar os farelos dos salgadinhos nas calças. Vicente gosta de freqüentar o estádio. Vicente gosta de comer sorvete contornando as beiradas. Vicente gosta da sexta-feira.

Entre tantos gostos, o que meu filho mais gosta?

Observava o guri no final de semana. Com respeito. Como se fosse o pé direito de um quarto. Ele não parava quieto. Sua felicidade no final de semana é narração. Aponta e fala. Fala o que aponta.

Posso estar enganado, mas o que meu filho realmente gosta é de conversar.

Quando não cancelamos os ouvidos para forçá-lo a se ocupar com suas coisas. Não o empurramos ao seu canto e para seus brinquedos. Não o diminuímos diante de nossas leituras e afazeres miúdos.

O que fará uma criança crescer confiante é o tempo que dedicamos para escutá-la. É o tempo que propomos perguntas e a continuidade do raciocínio. O tempo em que legitimamos suas descobertas. O tempo em que não suspendemos sua curiosidade com elogios vadios: que bonito!, ótimo!, é isso mesmo!. Exclamações que pretendem enterrar o assunto e nos liberar para nossas atividades.

Ele se verá importante se eu valorizar o que ele escolhe para dizer, seus rascunhos e vacilações, seu modo de se organizar. Não é enchendo de mimos e presentes. Não é numa semana hiperativa, com passeios emendados e a adrenalina das surpresas. Toda criança tem um acesso estreito de sua imaginação para os pais. Deixará aberto se for usado. É tabuada: nenhuma criança dorme com a porta fechada, por que fechá-la durante o dia?

O autismo vem no momento em que a solidão é maior do que nossa capacidade de explicá-la.

Numa manhã e tarde modorrenta, com chuva intensa, trancados na residência, faltou luz. Escureceu dentro e fora. Acendemos velas e ficamos ao redor de uma mesa, brincando de adivinhar vultos, gesticulando fantoches nas paredes. A cera derretendo dá vontade de pescar sombras. De minha parte, conversava para matar o tempo e espantar o período de exceção. Reagia mais ao tédio do que à vida (mas é somente no tédio que suspiro). Restava a certeza de que era o pior dia do Vicente. Ele não fez nada do que admirava. Não brincou, não alisou o pó de seus carrinhos, não circulou pelo terraço.

Ao cabo da noite, ao apressar as cobertas e a virada do calendário, me confessou que nunca tinha sido tão feliz. Como? Sim, o óbvio é o imprevisível; por um momento contou com a audição de meus cílios. Maravilhosamente, eu olhei o que ouvia, não ouvia como quem olha. Sem querer, não descolamos um minuto da respiração. Um poderia embaçar o rosto do outro, tamanha a proximidade.

Meu filho procura entender o mundo. Posso ajudá-lo. Talvez ele tenha mais chance do que eu.

Juliano RigattiPais, leiam isso!
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