Espelho meu: irmã Adriana

4 comments

Eu tava na sexta ou na sétima série do primeiro grau – ensino médio hoje – do Colégio Espírito Santo, em Canoas, Rio Grande do Sul. Perto de completar 11 anos de estudo sob os olhos das Irmãs Missionárias Servas do Espírito Santo. Um colégio de freiras, portanto. Já ouvi muitos contarem que estudaram em colégio de freira. Poucos gostaram da experiência. Talvez alguns, a minoria, ignore o fato de ter aprendido boas coisas com elas. Agora, a maioria, a esmagadora maioria, faz piada dos métodos, dos retrógrados métodos, usados por elas na tentativa de disciplinar, catequizar ou converter aqueles perversos adolescentes – ainda mais perversos hoje, imagino eu. Isso, portanto, é fato: a minha geração ignora as freiras.

Não fosse a irmã Adriana, eu também as ignoraria hoje. Embora tivesse nascido em berço cristão católico, eu, confesso, sempre fazia graça da boa intenção das freiras em nos colocar no caminho do bem. Quase sempre eram velhinhas ou senhoras de certa idade aplicando técnicas pedagógicas questionáveis – pra não dizer absurdas. Rogo a Deus para que isso tenha mudado. Me explico melhor. A educação brasileira, a paupérrima educação brasileira, sempre preocupou-se em avançar, em adaptar-se aos novos tempos, a falar a língua dos jovens. Há teses e teses que afirmam que o jovem não aprende se não sentir-se atraído pela matéria. E o “sentir-se atraído” tem, concordo, inúmeras variáveis. O que condeno é que o ensino do evangelho, tentativa muitíssimo bem intencionada das freiras de colégios, não acompanha essa evolução da educação. Pelo menos, não acompanhava na minha época. Ignoravam solenemente o desagrado que causavam e não mudavam uma vírgula do seu catequismo.

Claro que minha proximidade com o tema religião, vez ou outra me fazia ser o aluno preferido delas. A irmã Maria Emilia e depois a irmã Sirlene (acho q era esse o nome dela), no CLJ, merecem de mim excelentes recordações. Afetuosas, fizeram Deus parecer bem menos ranzinza.

Mas a irmã Adriana, falemos da irmã Adriana. Posso dizer, com honestidade, que ela mudou a minha particular forma de ver as freiras. Não os seus métodos de ensino, os quais ainda critico. Mas as mulheres freiras. A irmã Adriana fez-me entender a grandiosidade dessa vocação. Largam pais, mães e irmãos. Largam a possibilidade de constituir uma família. De ter filhos. Largam o homem. Por uma causa que acreditam ferozmente. Só depois da irmã Adriana é que posso lembrar daquele vídeo que passavam na sexta ou sétima serie e entender o que faziam ali aquelas cenas de magérrimas crianças africanas e o que isso tinha a ver conosco, crianças bem alimentadas e bem vestidas, e com elas, as freiras. A irmã Adriana, sem saber, é pra mim o testemunho vivo do serviço, da doação e da entrega a Deus. Ao mesmo tempo – e isso é o mais meritoso – em que foi a irmã mais baderneira que conheci. Recém ingressa na congregação das irmãs do colégio aqui perto de casa, ela veio passar um tempo em Canoas. Escolheu o CLJ (Curso de Liderança Juvenil), grupo de jovens da Igreja Católica, para fazer parte da sua rotina de trabalho. E fez-se jovem como nos éramos jovens. Ia a passeios, a festas. Ajudava a resolver os problemas e nos defendia em qualquer situação. Mesmo que em muitas delas não fôssemos sequer razoáveis. Ela falava a nossa língua, sobretudo.

Deixou-nos faz um bom tempo já. Hoje vive, com 34 anos, em Ponta Grossa, no Paraná. As Irmãs Servas do Espírito Santo estão em festa hoje, diga-se. Pelo que soube, a Madre Josefa Stenmanns (1852-1903), co-fundadora da congregação, organização essa que tanto ouvíamos falar no tempo de colégio, será beatificada neste domingo, 29 de junho de 2008.

Se bem conheço a irmã Adriana, ela deve preencher seus dias hoje com a saudade que sente dos pais, com os estudos, fazendo festa e baderna com os jovens paranaenses e rezando, rezando muito. Pela própria vocação e por todos nós. Forma-se em Direito no final desse ano. Tem orkut. E tem planos de ir trabalhar na África em breve. Em Ghana. Acho que naquele mesmo lugar do vídeo que víamos quando estávamos na sexta ou sétima série do Colégio Espírito Santo. Crianças negras famintas que olhavam para as crianças nutridas do outro lado do Atlântico, suplicando por ajuda. Eram afagadas, no vídeo, por freiras. Freiras como Madre Tereza de Calcutá. Freiras como a irmã Adriana e como milhares delas por ai.

A entrevista:
– A palavra mais bonita da língua portuguesa: amor e doação
– A mais feia: injustiça e preconceito
– O pior defeito de alguém: falsidade e traição
– Qual tua idéia de domingo perfeito? aquele dedicado às coisas do meu Senhor e na vivência fraterna com minhas co-irmãs
– O que queres estar fazendo e onde queres estar vivendo com 60 anos? estarei servindo… onde Deus Uno e Trino precisar de mim…
– Qual tua memória mais antiga? aconchego do lar… familia unida e feliz
– Qual tua idéia de felicidade? viver o chamado de Deus de forma plena
– Onde gostarias de viver hoje? onde estou vivendo
– Onde gostarias de passear agora? Nordeste
– Se pudesses eternizar alguém, quem seria? a presença do Deus Uno e Trino no coração do ser humano
– O que é a morte pra ti? passagem
– O que tu fazes que te dá muito prazer? servir o necessitados da fé, de amor, de atenção, acolhimento…
– O que fazes para espantar a tristeza? eu olho pra jesus na cruz
– Um filme: Lágrima do sol, Pássaros feridos
– Um livro: Treinando as emoções pra ser feliz e o Futuro da humanidade (Augusto Cury), A luta pelo direito (Rudolf Von Ihering)
– Um som/música: Se conhecesse o Dom de Deus (Adriana), Sentimentos (Vera Lúcia)
– Um lugar: a capela de nossa comunidade
– Um site: não tenho predileção, gosto de vários sites de pesquisa
– Uma coleção (que tens ou já tiveste): nunca tive
– Um doce: chocolate
– Uma bebida: água
– Um prato: arroz e feijão
– O que já cozinhou de mais extravagante (da torrada com orégano ao
pato ao molho de laranja)? frango cremoso
– O conselho que nunca esqueceu:”Tudo nos é permitido, mas nem tudo nos convém.” (São Paulo)
– Um pensamento:
“Preocupe-se mais com sua consciência do que com sua reputação. Porque a sua consciência é o que você é, e a sua reputação é o que os outros pensam de você. E o que o outros pensam de você, é problema deles.” (não sei quem é o autor)
Aprendi com o desafios da vida, que é isso que importa… o que você é enquanto essência.

Juliano RigattiEspelho meu: irmã Adriana

4 comments

Join the conversation
  • roberto, - 29 de junho de 2008 reply

    Juliano e Adriana,
    um brinde, um viva !,

    grato por recordar as luzes do Espírito Santo
    entre nossas sombras,
    grato por partilharem algo extremamente divino
    escondindo no humano,
    Pe. Roberto,
    de alma lavada !

  • simone hentschel loureiro - 30 de junho de 2008 reply

    Bom dia! Saudades das irmãs, saudades do colégio, das muitas experiências vividas lá, que contribuem tanto para nossa formação…tenho muitas lembranças boas deste tempo…da professora Deolinda, das irmãs, da diretora..pessoas maravilhosas que dedicam sua vida para ensinar…abraços simone!

  • nilcelia - 14 de setembro de 2009 reply

    Olá tudo joia que legal ter te encontrado fiquei feliz bjs.

  • nilcelia - 14 de setembro de 2009 reply

    Olá Adriana ,tudo joia fiquei feliz em ler seus escritos.abraço.

Deixe uma resposta para nilcelia Cancelar resposta

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *