Par ou ímpar?

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Tem coisas que são par. Outras são únicas.

Oito, oito e pouco. Caminho desviando de alguns. Quando chove, as goteiras da parada de ônibus ali da Farrapos pegam bem em mim. Um saco. O telhado não termina na calçada, termina antes. Uma droga. Ando, paro e me viro de costas para ver os ônibus que se aproximam. O meu é um azul, com letreiro digital, vai pra Sertório. Faço sinal, ele pára, eu entro e agradeço, quase sempre. Dou a fichinha, procuro um lugar e sento. Isso é par. Acontece quase todo dia assim, igualzinho.

Marcaram para as três da tarde de sexta-feira a saída para o Cenáculo de Maria. A edição 109 de Porto Alegre. Cristo morreu às três também. Viajamos até Salvador do Sul e todas as horas que se seguiram até às 23h de domingo, quando cheguei em casa, foram todas únicas, ímpares. Havia muito tempo que eu não sentia coisas tão boas tão intensamente. Estava com pessoas das quais gosto muito, fiz coisas das quais também gosto muito. Durante todo o dia de sábado a casa onde estávamos ficou cercada por uma neblina espessa. A sensação de que estávamos em algum lugar parecido com o céu foi, portanto, além de sensorial, também visual. No domingo, o sol abriu e o dia terminou encoberto. Terminou com pessoas diferentes. Aquelas que desceram dos ônibus na sexta à noite não eram mais as que voltavam. Lavagem cerebral? Magia negra? Regressão a vidas passadas? Que nada. De uma forma extremamente simples, apenas fomos incentivados a olhar pra dentro de nós mesmos e admirar-nos com a beleza que Deus criou em cada um. Isso, só isso. Três dias assim, como esses que vivi, nunca tinha vivo antes e nunca mais se repetirão. Isso é ímpar, é único.

A vida fica tão valorizada que quase ganha forma quando estamos vivendo momentos únicos. Parece que não tá mais só dentro de nós e de coisas. Parece que dá pra pegar. Os momentos pares, por outro lado, nos arremessam na rotina da vida, onde segundo copia segundo e horas são cópias de horas que se repetem a todo instante. Nada é novo e não há motivo para seguir em frente a não ser para não interferir na cópia dos dias. O único é diferente. Dá sentido à existência. É como o nascimento de um bebê. É como aquela flor que não estava assim, aberta, ontem quando vim aqui. É como o e-mail aquele que não tinha chegado com o beijo dela ontem quando conectei. É o abraço e o valeu com o qual o chefe nos surpreendeu no final do dia.

Você não tem tido momentos únicos? Faz assim. Transforma os pares em ímpares. Percebe que cada vez que o ônibus chegar as pessoas estarão dispostas de forma diferente na calçada e adorarão receber um sorriso e um bom dia. O motorista e o cobrador então, ihh, nem se fala. A senhora aquela cheia de sacolas vai gostar muito que você ofereça o lugar ou segure as coisas pra ela. Uma oração para o colega aquele que não tem jeito. Um feliz aniversário para o cara da outra área que mal você cumprimenta vão fazer a diferença pra eles naquele dia. Complicado fazer a vida repleta de momentos únicos?

Que nada. De novo é uma questão de escolha.

Juliano RigattiPar ou ímpar?

4 comments

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  • Jac Oliveira - 28 de julho de 2006 reply

    Tem dias em que há pouco a dizer. Hoje é um desses dias.
    Passei pra te dizer que li.
    bjos

    28/07/06

  • Elisa - 6 de agosto de 2006 reply

    Show! Esse é um belo texto para ser usado em treinamento!
    Bjs!
    Elisa

  • Juliano Filipe Rigatti - 6 de agosto de 2006 reply

    Um amigo importa também parado ali do lado, no silêncio. Valeu por ler dnovo, Jac. Beijo.

  • Juliano Filipe Rigatti - 6 de agosto de 2006 reply

    Elisa, só não cita o nome do associado! Hahaha! Beijo.

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