Prometi pros milhares de leitores da Uzina que, a cada início de mês – não sei quanto tempo isso vai durar –, colocaria aqui algum texto produzido por mim nos tempos de faculdade. Tempos bons. Aquela atmosfera me fazia bem. Enquanto o trem chacoalhava de uma estação pra outra eu viajava lendo ou pensando. A inspiração de um professor, uma frase perdida de alguém que conversava do meu lado. O silêncio dos passageiros também tinha sua utilidade. O cansaço vinha depois, já em casa. Tarde demais. Alguma coisa minha cabeça já tinha criado.
Bom, o texto a seguir, que recuperei de junho de 2003.
Crônica dos espaços
Onze em ponto era a hora do trensurb chegar na estação. Os vagões traziam gente de todos os tipos, mas em geral estudantes de universidades da redondeza. O trem passava e recolhia em diferentes pontos da região metropolitana, jovens e adultos que, enfim, terminavam mais um dia e retornavam para suas casas.
O ruído agudo que parecia sair de dentro da porta sinalizava que ninguém mais poderia entrar nem sair do vagão.
Retomando o movimento, o trem despedia-se respeitoso de mais uma tarefa cumprida. Aquela multidão de mochilas, pastas, e casacos pisava em solo firme e acumulava-se nos corredores que davam acesso à saída da plataforma. Acho que minha mãe compararia aquilo com um imenso formigueiro. Todos caminhavam triunfantes depois de mais um dia vencido.
O céu, sempre muito escuro, revelava uma bela lua. Estrelas. E muito frio. Era o tipo de dia que fora feito para ninguém sair de casa. Frio mesmo.
Na saída da plataforma, onde se vendem bilhetes para o trem, ali estava aquele senhor. Aparentava seus trinta e cinco, quarenta anos. Nem muito mais nem muito menos. De certo, esperava alguém.
Comentários