Devemos nosso Natal às toalhas de banho

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As pessoas vivem nesse mundo movidas pelas teses que criam para si mesmas. Sobre a cerveja preferida, sobre loiras e morenas, sobre o juízo que os outros fazem de nós, sobre a existência de Deus e a inexistência do Papai-noel, sobre o caro e o barato, sobre as razões que impedem nossos sonhos de se concretizarem, sobre o valor do voto em branco, sobre o tamanho das torcida da dupla Grenal, sobre tudo. Para tudo, cria-se teses. E é a crença reta nas teses que criamos para nós mesmos é que nos traz mais ou menos paz.

Acabei de formular mais uma tese pra mim. Sabem qual é? A que afirma que as toalhas de banho com extensas bordas de tecido decorativo são as causadoras de todo o mal capitalista e da infelicidade humana.

E minha tese dirige-se especialmente ao Natal.

Querem ver uma coisa? Olhem bem pro Natal, mas olhem nos olhos, e me digam qual é o seu verdadeiro sentido. Me digam. É uma data cristã, que referencia o nascimento do mais importante de seus homens, Jesus Cristo, e que significa para nós, homens e mulheres, um tempo de renascimento. De reflexão, de fechar-se para balanço. Basicamente, isso. A troca de presentes serve para tornar concreta a intenção de fortificar os laços de afeto entre as pessoas, por isso elas os usam, os presentes, como sinal da amizade, do amor ou até da reconciliação.

Isso, pra quem não sabe, deveria ser o Natal.

Mas e o que é o Natal hoje? Nada. Ele é a borda de 20cm de tecido decorativo localizada na extremidade da toalha de banho. É um nada. Ele é pior do que o nada. Porque o tecido decorativo ou o crochê da toalha de banho não só deixam de secar, como espalham a água pelo corpo. Assim, é o Natal. Decorativo e completamente inútil. “Por mim, podíamos pular o Natal e ir direto pro réveillon.” Ouvi isso dia desses lá no trabalho. Ah, por mim, do jeito que está, também podia. Riscar o 25 do calendário. Porque as pessoas correm, correm e correm no mês mais curto e mais cheio do ano, geralmente para comprar um bem que vale muito menos do que pagam por ele, e presentear sem ao menos olhar nos olhos. E amigos secretos com listas de presente, então? Artificialismo puro. E as tais tradições da mesa, o que são? Quem explica a necessidade quase existencial de servir muito mais do que se pode comer, entre perus, panetones, compotas com creme de leite, salgados e guloseimas especiais?

Nosso Natal virou um nada, recheado com um grande vazio. É isso que ele virou.

Quando tudo não é ainda pior. Porque é nessa época de festas de fim de ano, quando celebramos o nada, que os assaltos a estabelecimentos comerciais aumentam. Trabalho num deles e sei disso. No fundo, bem no fundo, a gente sabe porquê esses assaltos aumentam, né? Porque há milhares que também gostariam de participar conosco dessa gastança e não podem. Por isso, roubam e até matam. Para saciar sua própria fome e a fome dos seus? Nesses dias do ano, não. Cometem toda sorte de delitos como se gritassem, como se suplicassem a nós para que os deixemos participar da celebração do nada.

Por isso, abaixo às toalhas de banho com seus 20cm de tecido decorativo! Sumam com elas de nosso meio! Porque, não secando nossos corpos e cabelos molhados, elas só nos fazem lembrar que há, entre nós, a cultura do inútil, do vazio e das celebrações sem sentido algum.

Juliano RigattiDevemos nosso Natal às toalhas de banho
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