A idade de amar

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(Publicado em Zero Hora, no Dia dos Namorados. Que na real, pode ser todos os dias) 

Moradores de um asilo em Carlos Barbosa, na Serra, o casal Mercedes Joana Tossin, 89 anos, e Alvaro José dos Santos, 96 anos, conheceram-se há seis meses, apaixonaram-se e agora querem se casar. A ex-costureira farroupilhense e o ex-funcionário público de Lagoa Vermelha vivem cada minuto como se fosse o primeiro.  

– Nesse fiapo de tempo aqui na Terra temos de aproveitar. Se decidirmos nos casar, já tenho o terno e a cama de casal – diverte-se Santos, viúvo duas vezes e pai de nove filhos, que moram em Porto Alegre e na Região Metropolitana.  

Mercedes nunca se casou, nem tem filhos, e agora exibe com orgulho a aliança na mão direita, presente ganho há poucos dias do segundo namorado de sua vida. O anel não foi bem um pedido de noivado. Santos prefere usá-lo na mão esquerda.  

– Nosso amor é diferente, mais livre. Não tem sexo, é puro que nem criança – diz Mercedes.  

Nenhum dois dois imaginava que poderia viver uma história assim a esta altura da vida.  

– Desde que cheguei (ao asilo), nos encantamos um pelo outro. Agora, conversamos muito. Ela me leva para dormir, me dá beijo de boa-noite – conta Santos, dependente de uma cadeira de rodas.  

Não se sabe se o casamento será oficializado. De qualquer forma, neste Dia dos Namorados, o casal prova que é possível ganhar mais do que perder com a passagem dos anos.  

– O amor nunca morre, sempre nasce – diz Mercedes, seguidamente vista pelos corredores empurrando Santos na cadeira de rodas para breves passeios ao sol.

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Herói morto

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Dei uma rápida passado no google antes de vir aqui para ver se descobria de onde tinha tirado essa história de herói morto. Não achei. Não lembro se foi de alguém que ouvi ou se li em algum lugar. Herói morto. Não lembro mesmo. Bom, na falta de autor e de alguém que se acuse, vamos considerar que eu, sim, eu mesmo, criei essa tal expressão. Herói morto. A história é a seguinte. 

Não tem nada de reza a lenda ou de era uma vez. É coisa nossa mesmo, do dia-a-dia. Coisa que acontece com gente simples como a gente. Sempre. Todo dia quase damos uma de herói morto. 

Agora mesmo fiz isso. Eu estava relendo o parágrafo acima, atrás de errinhos bobos de português ou de sonoridade mesmo. Pra ver se estava certo e se estava bom de ler. A última frase não está. A palavra “quase” não parece estar dizendo que quase todo dia damos uma de herói. Parece estar dizendo que todos os dias nós quase damos uma de herói. Né? Olhem pro parágrafo de novo. Deixei errado ou corrigi? Sim, permanece errado. Meu raciocínio? Ah, o leitor que faça o trabalho dele, de entender o que eu escrevo. Certo? Certo. Fico com a minha razão enquanto o texto segue sem ser compreendido. 

Sabe aquela coisa de atravessar a rua movimentada sem olhar pros lados só por que o sinal estava aberto pra ti e fechado pros carros? Fazer alguma coisa que pro teu julgamento está certo, mas pra ordem natural da vida, não está. Dois, três passos, veio o carro, derrapagem, freio, gritos, pavor, curiosos em volta. Trânsito parado. Lamentos e óóós de um lado e do outro. As calçadas se esvaziam. Multidão em volta. Está morto. Mas ele estava certo, diria um dos curiosos. É, eu também vi, ele atravessou e o sinal estava fechado. Claro que tava, diria outro indignado, fechadíssimo. Uma multidão se aglomerou em volta do rapaz. Ou podia ser uma moça, tanto faz. Velinhas chorosas já rezavam pela alma do pobre jovem. Ou da pobre jovem. Do outro lado, três senhores já esbravejavam com o fiscal de trânsito tentando-o convencer que o sinal estava mesmo fechado. Eu vi, vermelho, tava vermelho pros carros e ele passou. Eu também vi, que absurdo! O cara tava certo, seu guarda. Não, não o motorista, o morto. O morto estava certo. Certo, mas morto. 

Vamos considerar que foi numa reflexão rápida dessas, atravessando a rua dia desses, com o sinal fechado pros carros, que nasceu a história do herói morto. Pode até ser. E ela me vem quase sempre. Sempre que eu tento justificar alguma coisa que estou fazendo de errado, de moralmente errado, de legalmente errado. Alguma coisa que certamente vai me prejudicar, mas que insisto pra mim mesmo, e convenço a mim mesmo que o que estou fazendo está certo. 

É como gazear uma noite de estudos e arquitetar uma desculpa infalível pra si mesmo. Ah, hoje cheguei tarde mesmo. Ah, eu sou meio relapso assim mesmo desde pequeno, não ia ser agora que ia mudar. Ah, se o Atlético, de Ibirubá, tivesse se classificado pra final, eu estaria assistindo o jogo agora e não estaria estudando mesmo. Ah, sabe a da rua de trás? Disseram que ela ia me convidar pra sair hoje. Não acreditei quando disseram. Papo. Mas imaginem se ela tivesse mesmo me convidado pra sair. Não poderia estudar hoje. Viu só? Não vou estudar hoje, paciência.

O tempo correu, mais um dia produtivo se foi, e você, por aqui de razão, desperdiçou mais uma noite de estudo. Tá bom, você estava certo. Ninguém lhe tirará a razão. Até porque a discussão não saiu muito de você com você mesmo.

Isso é ser herói morto. Herói pra você e morto para os demais. Porque não vivemos às custas do julgamento do nosso umbigo. Vivemos em um sistema que possui regras. Senão legais, regras morais, regras que nos comprometemos a seguir sem nem mesmo saber. Mas é assim.

Ih, o e-mail aquele chegou. Solicitação de apresentação, diz o assunto. Não vou abrir. Seis e dez. Isso são horas, você se pergunta. Essa hora já era pra eu estar fechando as coisas. E se eu tivesse saído mais cedo, pergunta de novo. Nem teria visto esse e-mail. Mas você viu o e-mail chegar, diria a vozinha aquela. Aquela voz do juízo que não gosta de ver o herói morto. A noite vem, esfria o tempo, você vai pra casa, toma banho, janta, dorme até o dia amanhecer, caminha, desce, sobe, pega o ônibus, chega ao trabalho e recebe uma ligação urgente. Precisa entregar a apresentação em dez minutos. Na mesa do chefe em dez minutos. Foi solicitada ontem, em cima da hora, onde é que já se viu isso, pergunta você a você mesmo. Indignado. Herói. Herói pra você. E se não entregar a apresentação em dez minutos, não morto, mas queimado com o chefe.

Bocejei agora. O sono pegou. Cansado, o dia vai começar ouvindo minha discussão comigo mesmo. Sonolento, argumentarei dizendo que esse texto tinha que sair. Herói morto.

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Dupla personalidade

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O mais divertido que me vem sobre assunto que resolvi escrever, é um quadro do Chaves, aquele seriado mexicano, transmitido pelo sbt. A cena que ele resolve vender churros e fica chateado com a baixa clientela. Parado em frente à aquela porta de madeira, com seu inconfundível traje verde, chapéu de orelhas e suspensório, resolve apelar. Faz, ao mesmo tempo, o papel do vendedor e do comprador. Engrossa a voz quando fala o preço e a normaliza quando está, do lado de cá, comprando. O Chavinho resolvia, com a piada, dois problemas: a falta de interessados pelo churros e a sua fome, fiel companheira de todos os episódios. Humor inocente e competentíssimo. Inesquecível.

Mais tarde, na minha adolescência, lembro de ter lido um livro de Sidney Sheldon que tratava do disturbio de personalidade, da dupla personalidade. Era uma mulher que levava duas vidas completamente distintas, mas que era a mesma pessoa. O livro não revelou isso durante boa parte das páginas. Tratou-a como dois personagens. A surpresa é grande quando o leitor descobre a trama e ainda mais quando se dá conta que a doença existe e nos atinge.

Mais tarde ainda, um dias desses aí, o filme Amigo Oculto me impressionou. Principalmente por colocar o simpático Robin Williams num papel de protagonista do terror psicológico que se desenrola. O tema de dupla personalidade é novamente posto em cena e, novamente, surpreende a muitos pela sua gravidade e, de novo, por ser uma doença real.

Pois não é que a nossa imprensa sofre agora desse mal? Isso, a imprensa gaúcha sofre do distúrbio de dupla personalidade.

Foi tema recente das rodas de discussão de jornalistas e gente da mídia o fenômeno do fanatismo que rondou as ruas de Porto Alegre por ocasião da final da Libertadores, entre Grêmio e Boca Juniors. Todos se mostraram perplexos e preocupados com tamanho grau de insanidade de alguns torcedores, gremistas e colorados, quando o assunto é futebol. Disseram que a cidade corre um sério risco, que as pessoas de bem estão começando a ficar assustadas e, temerosas, evitam levar seus filhos a locais de concentração de torcedores. É mesmo, concordo, um exagero alguns fatos recentes de violência, de selvageria, de arruaça.

No mesmo grau que todos estes homens e mulheres, produtores da notícia, também estou completamente perplexo. Mas com outro fenômeno: o da dupla personalidade da imprensa. Para conquistar os ricos anunciantes, a mídia transforma o futebol no evento central da vida de qualquer cidadão, sendo ele torcedor ou não. E tem força pra isso, todos sabemos.

Ela mesma, a mídia, agenda nossas vidas todos os dias. Jornal do Almoço é hora de almoçar. Jornal Nacional é hora de jantar. Bom-dia Brasil é hora de se mandar.

Esta mesma mídia que produziu a semana da final da Libertadores como sendo o centro nervoso das nossas agendas, agora está boquiaberta. Como se armasse o circo, pusesse os atores em cena, cachorrinhos, micos adestrados, chamasse o público para o maior espetáculo da terra e quando todos estivessem às gargalhadas lá dentro, saisse pra rua e distribuisse críticas à pouca vergonha que se passa lá dentro, no circo.

Querem nos enlouquecer. Não, só pode.

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Eu tenho orgulho da política brasileira

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Inacreditável o dado que percebi no resultado da última pesquisa CNT/Sensus, divulgada hoje. Enquanto 826 (41,3%) pessoas atribuem à corrupção o principal motivo para não ter orgulho do Brasil, outras 60 pessoas (0,03%) — anote este número: 60 — dizem que têm orgulho deste país por causa de sua política.

É, eu também fiz essa cara quando soube. É um dado alarmante e mais um sinal de que conhecemos pouco as pessoas que vivem conosco aqui.

Ou os pesquisadores encontraram sessenta brincalhőes que tiraram onda com o trabalho deles, ou precisamos repensar com seriedade o acesso das pessoas aos meios de comunicação e à forma como as informações estão chegando a estas dezenas de prováveis eleitores.

Para a pesquisa, foram ouvidos 2 mil cidadãos e cidadãs em 24 estados, entre 18 e 22 de junho deste ano.

Sessenta pessoas estufam o peito e dizem ter orgulho da política brasileira. Gostaria de saber quem são.

Juliano RigattiEu tenho orgulho da política brasileira
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Saudoso

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tempo.jpg Olho pela janela do ônibus, lá fora. Enquanto o tempo arranca a paisagem jogando-a pra trás, o gelado dos meus pés traz a lembrança daquelas mãos frias. E isto não perece aqui dentro. Fica guardado na bagagem das memórias enquanto a estrada segue em frente.

Juliano RigattiSaudoso
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Uma caixinha de surpresas

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Numa bela noite estrelada, o Grêmio ficou em segundo na Libertadores.

Qualquer um ficaria abatido. Qualquer um ficaria chateado. Qualquer um ficaria descrente da vitória no estádio na beira do lago.

Mas este, senhoras e senhores, é o Grêmio. Aquele que, mesmo na dificuldade, não desiste. Não morre.

E a vida, ah, a vida. Esta, sim, é uma caixinha de surpresas. Grêmio dois a zero.

gremio.jpg

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Pise na grama

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É uma visão da infância a esquina aqui perto de casa onde jogávamos bola de manhã e de tarde, todo o santo dia. A calçada era de pedra de basalto e era delimitada pelo portão eletrônico do Ilha de Itaparica, o prédio imponente que tinha a frente pra rua Dom Pedro II.

Bom, o fato é que pra dobrar a esquina quando tinha que buscar a bola ou mesmo pra ir buscar pão na padaria tinha que desviar de um pedaço de grama que eu sempre achei que tinha sido plantado por alguém que nunca tinha passado ali a pé. Não, porque não tinha razão daquele pedaço de calçada ser de grama, não tinha. Pra evitar a grama, pra não pisar nela, tinha que fazer o contorno, uns três passos a mais, contando meio por cima. Sim, porque quando se é criança, um dia é mais longo que um dia de adulto, um ano é maior que um ano de adulto e, lógico, os trajetos são mais compridos também. E três passos fazem diferença.

O fato é que eu nunca pisava na grama. Nunca. Contornava o canteiro e seguia meu caminho. Pra buscar a bola ou o pão. Pisar na grama era transgredir, era desobedecer a uma ordem social imposta por não sei quem. O correto era passar pela calçada. Ou pela rua. Mas não pela grama.


O tempo passou. Os dias ficaram mais curtos, os anos voam (já é 2007?) e falar em um ou dois passou a mais parece uma incrível bobagem. Mas o fato é que a lembrança de não pisar na grama e respeitar o caminho sempre percorrido me veio esses dias, meio sem querer. Estava pensando justamente sobre isso: sobre fazer as coisas porque sempre foram feitas assim. Desviar da grama, caminhar pela calçada.


Pise na grama. E com gosto. É como que se todos tivéssemos que desrespeitar essa regra durante a vida, passando a pisar em gramas por aí. Desviar do caminho tradicional e pisotear com gosto aquele outro nunca antes experimentado. Pisar na grama é considerar a outra possibilidade. Muitas vezes a possibilidade vencedora, alegre, gratificante, pacífica. Tens uma palestra pra dar? Uma reunião pra conduzir? Uma viagem? O encontro aquele? A possibilidade do fracasso e da cena do detalhe dando errado é quase que automática. Muitas vezes é inconcebível que passemos com sucesso e satisfação por um instante de provação ou de risco. E por quê? Porque não nos damos o direito de pisar na grama.


Tudo o que vemos ou vislumbramos para nossa vida é, num primeiro instante, desenhado dentro da nossa cabeça. E a nós é dada, a todo momento, a chance de tomar o lápis e rabiscar a realidade. Isso é provado, é comprovado, é ciência.


Não sei se já disse aqui, mas o documentário “Quem somos nós?” é categórico nessa questão. Com sensores ligados ao cérebro, um rapaz é colocado em frente a uma cesta de frutas. Com fome, algumas regiões do seu cérebro reagem e o monitor que acompanha o teste mostra as áreas da massa cinzenta que se iluminam. Em seguida, a cesta de frutas é tirada dali, o rapaz fecha os olhos e é sugestionado a imaginar as mesmas frutas. Na tela do aparelho medidor, a mesma imagem: o cérebro iluminado nas mesmas regiões.


Pisar na grama é desrespeitar aquela regra que nos acostumamos. Pisar na grama é desordenar o destino da próxima cena da vida e sugestionar ao acaso o que queremos que ele nos traga. Pisar na grama é considerar que a calçada ou o meio da rua não são as únicas possibilidades.


Se estás lendo isso aqui de dia, pise na grama para o próximo desafio do seu dia. Aquele que te deixa apreensivo por causa do seu grau de risco. Não dê chance para o insucesso. Apague ele do desenho que estás fazendo. Se já é noite, acorde e pise na grama. Ao contrário do dia estressante que passou, amanhã tudo estará em paz. Se é assim que queres com todas as forças, é exatamente assim que será.


Não considere somente a possibilidade de sempre. Considere a chance de ser feliz. Considere a chance de aquele momento te trazer mais gratificação do que nervosismo.


Anos depois, já não jogava mais bola todo dia, mas a calçada e a grama continuavam lá, à sombra do Ilha de Itaparica. No lugar da grama aquela, vejam só: uma nova calçada. Uma calçada cruzando a esquina, desenhando exatamente o caminho que eu sempre me perguntava por que não podia existir. Outros pisaram na grama, e pisaram tanto que alguém resolveu trocar o barro que tava surgindo por pedras de basalto.


O inconcebível e o impensável só não existem porque ainda não foram considerados concebíveis e plausíveis. Pise na grama. Construa calçadas onde hoje há grama. Edifique novos caminhos, novas possibilidades.


“Ele não sabia que era impossível. Foi lá e fez.”

Jean Cocteau

(Ótima foto: Jacqueline Oliveira)

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Beijo roubado

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(Artigo de Maria Valéria de Lima Shneider, Escritora e professora, publicado no jornal Zero Hora, de 12/06, Dia dos Namorados)

O que irei relatar a seguir não serão conversas enigmáticas que a mídia tem divulgado, inclusive com gravações telefônicas que alguns ministros, deputados federais e até “parentes do rei” estão tendo ultimamente, para combinarem quanto de suborno receberão para esta ou aquela transação, sabidamente ilícita.

Nem é o nome do mais recente esquema que a Polícia Federal está desbaratando.

Tampouco descreverei o último filme ficcional de Scorsese ou de Bruno Barreto.

Beijo roubado aqui será tratado na sua forma literal: alguém rouba (portanto, sem consentimento) um beijo de outro alguém.

Isso já aconteceu com você?

Se buscarmos fundo na memória, todos têm um momento assim.

Conheço pelo menos cinco histórias, umas bem singelas e outras, com  seqüelas.

Falando nisso, uma dessas histórias de beijo roubado – das quais não posso relatar – anda de boca em boca pelas ruas e rádios do nosso Rio Grande do Sul, como se fosse piada.

Mas não o é.

Engraçado, que eu mesma tenho três.

Hão de me perguntar: – Por que engraçado?

É que elas são assim: o primeiro beijo que me foi roubado, eu tinha 21 anos e o ladrão, uns 35.

Eu estava numa danceteria (para os mais novos, balada), sozinha e, certo dia, o dono do local me lascou um rápido beijo na boca. Bitoca, como se dizia.

E saiu.

Passou muito tempo sem me olhar de frente.

Aliás, antes do beijo, ele também nunca havia me olhado.

Foi uma cena bem estranha, confesso. Para ambos.

A segunda vez, eu tinha uns 25 e o gaiato era um pouquinho mais novo que eu.

Estávamos em um grupo grande de amigos, na Serra, domingo à tarde, numa festa de aniversário daquelas tipo Kerb, ou seja, de dia inteiro.

Depois de ter passado a noite dançando, eu cochilava: cabeça encostada no espaldar duma cadeira de balanço, pés em uma banqueta, braços ao longo do corpo.

Num repente, acordo-me ainda sonada. Viro-me para o lado e o segundo ladrão estava a me olhar, andando de ré.

E ficou por isso mesmo. Ele havia me dado um beijo suave na bochecha. Um beijo de amigo, pois sabia que eu estava mal da alma, por eu e meu noivo (alguém ainda lembra o que é isso?) estarmos brigados.

E, por fim, o terceiro beijo roubado foi há exatamente 15 dias.

Eu, já com 40 passados, e o roubador de beijos, cinco.

É, cinco anos.

Estava sentada nessas cadeiras baixinhas de criança de jardim de infância, quando um menininho veio por trás de mim, parou, me deu um beijinho na bochecha, e saiu correndo para pegar um bonequinho de plástico.

Perceberam onde está a parte engraçada? Não?

Então explico.

Quanto mais velha fico, mais são jovens os que se interessam em roubar-me beijos!

Lá pelos meus 65, acho que só os bebês se interessarão por mim… Talvez meus netos.

Portanto, enquanto há tempo, aproveite o seu Dia dos Namorados.

Neste dia (muito apelativo para quem está sozinho), vem o desespero de se ter ninguém.

Uma pressão no peito, de se saber, não se ser, valor de alguém…

Juliano RigattiBeijo roubado
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